sábado, 5 de novembro de 2011

Confeiteiras de uma nota só



- A pauta me chegou de um jeito. Não me fisgou.  Mas apuração vai, apuração vem. Histórias inspiradoras surgem, finais felizes em comum...Sugere outro  gancho às chefes e...uma matéria saborosa e inspiradora surge nas páginas do Variedades, no dia 21 de outubro, no Jornal da Tarde. E que eu tive o prazer de escrever  e - melhor ainda - apurar. Viva os personagens anônimos incríveis!  Aproveito este sábado de plantão, mas ensolarado, quentinho com brisa fresca e aproveitado pela manhã num parque de SP, para indicar a leitura! 
E nunca é tarde para recomeçar! Conclusão tirada a partir das histórias abaixo!

Beijos! ; )

CONFEITEIRAS DE UMA NOTA SÓ
Doceiras investem na venda de apenas um tipo de doce e são um verdadeiro hit. Em comum, além da devoção, elas têm um segredo para o sucesso: uma ligação afetiva com as suas criações

Por Marcela Rodrigues Silva

Um passeio pela Rua dos Pinheiros, zona oeste da capital, especialmente perto do número 282, é uma experiência que desperta os sentidos. Um aroma doce atinge a calçada antes mesmo que os olhos sejam atraídos pela vitrine multicolorida de balas e pirulitos, infalível aos pequenos. Atravessar a porta é entrar numa verdadeira fantástica fábrica. De balinhas. E elas estão em todos os lugares, de todos os sabores e formatos, tão lustrosas quanto apetitosas.

O mesmo acontece numa casa bem ajeitadinha da Rua Capote Valente, não longe dali. O cheiro de brigadeiro quente vindo da panela desperta não só o apetite, mas lembranças genuínas de comilanças da infância. O local, porém, é point de adultos, que personalizam suas versões do tradicional docinho de festa de criança, imersos na linha de produção especializada nele. É uma ode ao brigadeiro.

As lojas de um produto só são hoje um hit do roteiro gastronômico da capital e têm nos doces sua faceta mais difundida: brigaderia, cupcakeria… Em comum, difundem também o conceito comfort food; a comida que desperta sensações agradáveis e evoca prazer e bem-estar a quem se entrega às degustações.

Por trás desses empreendimentos minuciosos, há historias de amor de empresárias que são também as donas da cozinha, e fizeram de suas guloseimas preferidas – segure a inveja – o ganha pão. Cada uma produz artesanalmente seu docinho, além de receber e encantar os clientes. “Parece modismo, mas o comfort food já é um reflexo comportamental. Depois da época do fast food, da comida rápida, as pessoas hoje buscam serviço personalizado e sensações, histórias”, diz Marcelo Traldi, professor de gastronomia do Senac.
Seguimos o delicioso rastro de alguns desses aromas que fazem sucesso na cidade e chegamos às histórias de cinco mulheres que investiram no comfort  food, antes mesmo de saber que esse era o nome de seu investimento. Sortudas, elas têm a chance de provar seu doce preferido todos os dias. E, pasme: de tão apaixonadas, garantem que jamais enjoam.

                                    (Cátia Farias e seus benditos quindins Foto: Leonardo Soares/AE)


BENDITO QUINDIN  - A receita de quindins de Cátia Farias, de 46 anos, é herança de família. O doce era aquela sobremesa que ela fazia aos fins de semanas ou nas festinhas dos filhos Lucas e Cauê, hoje com 20 e 22 anos, ou ainda quando recebia visitas. Era sucesso na certa. Mas só.  Até que, há uns três anos, Cátia e o marido passaram por uma dura crise financeira e perderam emprego, negócio e apartamento. Os filhos trancaram a faculdade. Cátia, para ajudar na casa, começou a vender esfihas na loja de uma amiga. À época, veio de Cauê a ideia de investir no valioso quindim. “Eu não tinha nada a perder”, relembra ela, que começou a fazer o doce por encomenda. Somente nesse ano, em julho, a família quitou as dívidas e abriu o Bendito Quindim – nome que dispensa explicação.
O doce tornou-se protagonista na história da família e hoje é hit no bairro do Tatuapé, zona leste, endereço da lojinha de 17 metros quadrados. “Eu faço os quindins em casa mesmo, de maneira artesanal. Os meninos e meu marido cuidam dos negócios”, diz Cátia. No começo do mês, ela ganhou uma ajuda da apresentadora Ana Maria Braga, da Globo. “Um amigo nosso falou de mim para a produção.”

No dia 6 de outubro, Ana Maria deu seu aval ao quindim de Cátia e afirmou, em rede nacional, que aquele era o melhor que tinha provado na vida. “A história é boa, o produto também. A sensação é que estou comendo uma coisa especial”, disse a apresentadora. No outro dia, uma fila se formou em frente à loja. “As pessoas iam chegando e falando que adoraram a ideia de comprar um quindim de qualidade, sem gosto de ovo”, conta, emocionada. Hoje, Cátia faz sozinha mais de mil quindins por dia. “Faço da mesma maneira que tanto fiz para meus filhos. Com o mesmo carinho.” Para cativar os clientes, no entanto, deu suas inventadas, e criou quindim de maracujá, café, abacaxi e chocolate. 

 Bendito Quindim (Rua Demétrio Ribeiro, 605, Tatuapé. 11- 3805-8430)





BOMBAS DE FELICIDADE 



 Os dotes culinários de Mariana Araújo, de 31 anos, também vieram da avó, de quem herdou o amor pela cozinha. Seu doce preferido: bomba de chocolate – a tradicional, é importante frisar, com recheio de creme e cobertura de chocolate. Desde que cresceu, porém, não encontrava uma loja que oferecesse uma receita que a satisfizesse. “Sentia falta de uma boa bomba em São Paulo, aquela bem fresquinha e original, sabe?”. A única solução para o problemão foi fazer, ela mesma, sua bomba perfeita em casa.
Durante 12 anos, os amigos foram os maiores beneficiados do hobby dessa publicitária prendada. Até que, no início deste ano, de tanto se dividir, Mariana se entregou à faculdade de gastronomia. Profissional das ideias, decidiu unir, enfim, o útil ao que mais lhe agradava. “Pensei: ‘Vou fazer algo que amo, que falta no mercado e que tem uma ligação sentimental com as pessoas, assim como tem para mim’.”
Desde então, estudou, testou e cozinhou. No início do mês, Mariana abriu, com uma sócia, amiga de infância, a La Bombe, uma pâtisserie especializada em éclair, nome francês que vem da expressão faire la bombe (que significa “levar a vida com prazer, explodir de felicidade”). “A bomba é tipicamente francesa e um dos doces mais antigos da culinária mundial”, diz, animada em ser dona da primeira loja do ramo no País. Além da bomba tradicional, criou outras 12 versões, com frutas vermelhas, doce de leite e pistache. A decoração caprichada mistura elementos das pâtisseries francesas com grafite. A cozinha envidraçada permite  visualizar a produção dos doces,  feitos um a um por ela mesma. “Quero vender bombas e sensações”, diz Mariana, que se sente realizada com a loja. “Um lugar para confortar a alma”, diz.   La Bombe (Rua dos  Pinheiros, 223. Pinheiros. 11- 2628-7667)


BRIGADEIRO COM GOSTO DE INFÂNCIA
                                                          (Foto: AE)


 A relação de Juliana Motter, de 30 anos, com o brigadeiro começou aos 6, quando ela aprendeu a receita tradicional da avó. De tanto que a pequena inventava de fazer o doce, ganhou o apelido: Maria Brigadeiro. Ela cresceu e, com ela, cresceu a paixão pelo doce. Sempre que podia, trazia chocolates finos de viagens para fazê-los em versão gourmet e presenteava os amigos. A primeira encomenda veio sem querer, de uma conhecida. Sem graça, Juliana não teve coragem de dizer que aquilo era um hobby. Deu conta do recado e, em alguns dias, se viu trabalhando em dupla jornada. Era jornalista de dia, doceira à noite.

Há cerca de três anos, Juliana largava o emprego de editora para viver de fazer seu doce preferido. O primeiro ateliê de brigadeiros gourmet do País já tinha nome: Maria Brigadeiro. O docinho de receita simples, mas com esmero e paciência, fidelizou uma clientela adulta que, há tempos, não provava o docinho ‘igual ao da avó’, como na época das festinhas de criança. Juliana se diz fã de comidinhas cheias de “afeto e aconchego”. Mas saiu da mesmice e criou outros 40

sabores para os brigadeiros, entre pistache, amendoim, chocolate meio-amargo e até cachaça.


A embalagem também tem todo um mimo: forminhas vintage e delicadas, embalagens que são marmitas embaladas em tecidos. Em pouco tempo, o ateliê ficou famoso, o brigadeiro voltou às boas, Juliana lançou livro (O Livro do Brigadeiro, Panda Books), mas recusou convites para quiosques em grandes shoppings. A expansão iria contra o conceito artesanal que sempre prezou em seu negócio.  Para tanto, conta com mais de 20 confeiteiras, que se dividem em turnos e aprenderam a fazer o brigadeiro genuíno. Josina Ferreira, de 36 anos, é uma delas e diz que foi quando começou a trabalhar no ateliê, há três anos, aprendeu a fazer “brigadeiro de verdade”. “Em casa, eu sempre fazia correndo, sem ponto, e usava margarina, qualquer achocolatado”, conta. E mesmo fazendo o doce o dia todo, Josina não enjoa. “A gente volta do almoço e já tem um brigadeiro esperando.” 

 -Ateliê Maria Brigadeiro (Rua Capote Valente, 68,  Pinheiros. 11- 3085 3687).  (Já escrevi um perfilzinho da Juliana AQUI)

BOLINHOS DE CONTOS DE FADAS 

                                       (Foto: André Lessa/AE)

Marcella Lage, de 29 anos, aprendeu a amar a arte de cozinhar ainda pequena, quando passava as férias na casa da avó, culinarista do interior do Rio de Janeiro. “Vó Ofélia era especialista em doces.” Mas a vida seguiu e somente há sete anos, formada em Turismo e Hotelaria, é que Marcella, carioca criada em Garanhuns (PE), veio a São Paulo fazer um curso de cozinheiro. “Eu já havia trabalhado na cozinha de hotéis e queria seguir essa área”, conta ela.
Foi nessa levada que conheceu a sócia, Paula Kenan, até então publicitária. Foi dela que partiu a ideia de abrirem, juntas, um negócio. Há dois anos, lado a lado, elas dividem panelas na fábrica no Brooklin, onde produzem “pequenos contos de fadas em forma de bolinho”, como elas definem o cupcake, palavra em inglês que quer dizer “bolo de caneca”, em tradução livre. Mas os de Marcela e Paula não são bolinhos comuns.
a cupcakeria das amigas faz wondercakes, nome que sugere “bolinhos para se  maravilhar”. Nas assadeiras das chefs, os bolinhos ganharam releituras criativas. “Passamos um ano pesquisando, testando receitas. Como brasileiro não gosta de pastas amanteigadas como as americanas, incluímos ingredientes daqui, como frutas e castanhas”, conta Marcella. São mais de 50 recheios para a base de chocolate belga e extrato de baunilha.

Na fábrica, Marcella coordena três turnos, com três confeiteiras cada. De lá, os bolinhos saem para quatro lojas. O segredo do sucesso, ela diz, é o mesmo para qualquer bom doce: evocar alguma lembrança em que prova o doce. “Cupcake não é um lanche qualquer, tem algo de lúdico nele. Tem de ser feito de maneira especial”, acredita. Não à toa, compara uma mordida no bolinho a uma dose de felicidade.
  - Wondercakes (Unidade Jardins. Rua Augusta, 2542. 11-3063-1209)


FANTÁSTICA FÁBRICA DE BALAS COLORIDAS 


 Mariana Charf, de 25 anos, sempre foi louca por guloseimas. Quando adulta, foi estudar arquitetura, mas continuava vendo nos doces uma ligação bonita e forte com sua infância. Em 2009, em uma viagem de férias com a família para Nova York (EUA), deparou-se com uma vitrine que a transportou a lembranças do passado. “Fiquei apaixonada quando vi aquela loja multicolorida.”
 De volta a São Paulo, Mariana largou o diploma e decidiu a abrir a primeira filial brasileira da Papabubble Caramels Artesans. Convidou uma amiga e, em  novembro do ano passado, abriu em Pinheiros uma loja que tem mais de 40 sabores de balas, entre cereja, mel, caipirinha e limão siciliano, e desenhos personalizados que vão de coraçãozinho a nomes. O cheiro doce que chega à calçada é um novo convite, agora aos outros, a entrar em sua fantástica fábrica de balas coloridas. “As pessoas entram pela curiosidade e, quando veem como é a bala, querem levar para filhos e até amigos adultos. E sempre voltam”, orgulha-se Mariana. Embora tenha status de rede – criada em 2004 em Barcelona e espalhada pelo mundo –, a loja fabrica uma bala totalmente artesanal. É a própria Mariana quem comanda a cozinha, de segunda a sábado, separada da loja apenas por uma mureta de vidro.
A proximidade, aliás, deixa tudo mais saboroso. Depois de escolher o sabor, o  cliente é convidado a acompanhar todo o processo de fabricação. Uma mistura de água, açúcar, glicose e essências vai ao fogo e se transforma numa grossa calda que, em seguida, é moldada na forma de cilindro sobre a bancada. A massa recebe corantes e desenhos delicados. “As pessoas entram aqui e têm a mesma reação que eu tive há dois anos. É mais que comprar uma bala”, diz.  

 Papabubble ( Rua dos Pinheiros, 282, Pinheiros. 11- 2768-2282)





Por Marcela Rodrigues Silva
Variedades/ Jornal da Tarde/ 21/10/2011


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